Em junho, o físico João A. B. Coelho, do Laboratório de Astropartículas e Cosmologia da França, apresentou um projeto inovador que pode ajudar a detectar partículas subatômicas chamadas neutrinos no fundo do oceano.
Durante uma conferência, ele explicou como uma série de “olhos artificiais” esféricos poderia captar esses neutrinos a partir do leito marinho ao largo da costa da Sicília. Estes sensores estão protegidos em múltiplas camadas de esferas, formando uma instalação maciça que pode revelar segredos do universo.
Construir infraestruturas em águas profundas é um desafio imenso. A instalação ARCA, parte do projeto KM3NeT, está situada a cerca de 3.500 metros de profundidade no Mar Mediterrâneo, onde a pressão atinge 348 atmosferas.
Essa profundidade extrema protege os sensores de grande parte do ruído eletromagnético da superfície, melhorando a capacidade de observação dos neutrinos. As condições adversas do fundo do mar tornam a missão complexa, mas essencial para a pesquisa de partículas.
Os sensores, dispostos em fios verticais de 700 metros de comprimento, são capazes de identificar três camadas distintas de ruído de partículas. A primeira camada é o “ruído óptico” natural, principalmente decorrente do decaimento do isótopo radioativo potássio 40.
Esse ruído constante pode ajudar a calibrar os instrumentos e, possivelmente, detectar neutrinos oriundos de supernovas. A segunda camada de ruído é causada por raios cósmicos que colidem com a atmosfera da Terra, produzindo partículas conhecidas como múons, que também auxiliam na calibração dos sensores.
A terceira camada é composta por neutrinos que se originam na atmosfera terrestre. Quando raios cósmicos atingem a atmosfera, eles geram múons que, ao decaírem, transformam-se em neutrinos de múon. Esses neutrinos são extremamente pequenos e podem atravessar praticamente qualquer material, inclusive a Terra e a água. O sistema ARCA é capaz de detectar esses neutrinos e determinar suas características.
Recentemente, Coelho insinuou uma descoberta emocionante: o ARCA pode ter detectado o neutrino mais energético já observado, provavelmente oriundo de um evento cósmico cataclísmico, o que abre novas possibilidades para a pesquisa de fenômenos astrofísicos.